Para os leitores desatentos, é apenas uma tirinha em quadrinhos no jornal diário. Entretanto, nem todas as publicações que veiculam a série Doonesbury nos EUA gostaram da abordagem satírica que o autor, Garry Trudeau, fez da lei antiaborto que está em vigor no Texas e em tramitação no Estado da Virgínia.
Os cartuns de Trudeau satirizam a retórica antiaborto que tem sido adotada em nível estadual e federal por deputados e senadores do Partido Republicano. Uma legislação do Texas requer que as mulheres que desejarem fazer abortos precisam antes passar por um exame ultrassom. A ideia, que está sendo discutida também na Virgínia, é fazer as mães reconsiderarem a sua decisão ao mostrar detalhes do feto.
Assinada em 2010 pelo governador do Texas e ex-pré-candidato republicano à Presidência, Rick Perry, a lei requer que os médicos mostrem e descrevam as imagens para as mães, e as façam ouvir as batidas do coração do feto. As mulheres podem se recusar a ver ou ouvir o ultrassom, mas não as palavras do médico. A legislação está sendo contestada na Justiça por uma junta de médicos que acusa o governo de transformar a categoria em mensageiros ideológicos.
Na Virgínia, o debate esquentou depois que médicos apontaram para o "detalhe" de que exames na fase inicial da gravidez só podem ser realizados através de um instrumento similar a uma varinha - o que levou entidades de defesa dos direitos reprodutivos a qualificarem a lei de "estupro de Estado".
Entretanto, todos os pré-candidatos republicanos mantêm posições firmes contra o aborto, e mesmo contra outras medidas de planejamento familiar. Opiniões compartilhadas por seu eleitorado, sobretudo nos Estados mais conservadores. As tirinhas de Trudeau alimentaram a polêmica, fazendo muitos jornais não se arriscarem a perder leitores conservadores com a publicação da sátira.
"Sentimos que o conteúdo (da tira Donnesbury) era demais para os leitores da nossa página de quadrinhos, voltada a família", expressou à agência AP um dos editores do diário Kansas City Star. O Oregonian, de Portland, afirmou que Trudeau "ultrapassou a linha do bom gosto e do humor com uma série sobre o aborto usando linguagem gráfica e imagens inapropriadas para nossa página de quadrinhos".
Sue Rush, editora do sindicato que publica a tira, Universal Click, disse que, não sabe "quantos jornais deram ou não deram" a tira, mas que entre 30 e 40 publicações pediram quadrinhos alternativos. É apenas a segunda vez nos mais de 40 anos da Doonesbury, publicada em 1,4 mil jornais em todo o mundo, que seu autor sofreu tanta objeção a seu trabalho. A primeira, em 1985, também tratava do mesmo tema: aborto.
"Ignorar (a polêmica) seria má prática da comédia", disse Trudeau ao jornal Washington Post, que optou por dar a tira. "Pensei que os direitos reprodutivos eram um assunto resolvido".
Confira abaixo a tira de Trudeau:
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